O ciberespaço é infinito?
Entre tudo aquilo que hoje temos como dado adquirido, o ciberespaço está perto do topo da lista. A promessa da Internet para o século XXI é disponibilizar tudo em todo o lado e a qualquer hora. Todas as realizações humanas, toda a cultura, poderão estar em breve alojadas em servidores e à distância de um simples clique.
Quando estamos online, o ciberespaço pode assemelhar-se muito ao espaço sideral ou, para usar um termo muito em voga, "a nuvem". Parece infinita e etérea; a informação está simplesmente lá fora. Mas se pensarmos sobre a energia do mundo real e o espaço físico ocupado pela Internet, começaremos a entender que as coisas não são assim tão simples. O ciberespaço tem existência real no espaço físico e quanto mais demorarmos a mudar o nosso conceito da Internet de modo a ver claramente as suas características físicas, mais perto estaremos de blogar o nosso caminho para a desgraça.
Agora, tudo o que lançamos para a nuvem, todas as fotos do Facebook e todos os vídeos do Youtube, estão sempre disponíveis para todos. Mas para manter esse compromisso de disponibilidade são necessários muitos prédios enormes, chamados centros de dados ou, mais apropriadamente dado o crescimento inexorável da Internet, server farms.
A fim de manter a disponibilidade total, omnipresente, como todos os utilizadores actuais da Internet esperam, muitas coisas têm que acontecer simultânea e continuamente;
- Os milhões de unidades de disco rígido que armazenam o conteúdo da Internet têm que ser ligados e girar a milhares de rotações por minuto, não apenas num local, mas também em vários sites espelho;
- O ar condicionado tem que manter os servidores arrefecidos;
- Redes eléctricas têm de ser estendidas para alimentar estes sites;
- Terrenos têm que ser adquiridos e construídas infra estruturas para albergar tudo isto;
- E um monte de electricidade tem de ser gerada, o que significa produzir muito dióxido de carbono.
O consumo do ciberespaço
Quanta? Segundo alguns especialistas, a nuvem já consome 1 a 2 por cento da electricidade do mundo. Isso é o que é preciso para manter 15 biliões de fotos no Facebook, entreter os muitos milhões que constantemente jogam online e hospedar todos os outros conteúdos que queremos sempre disponíveis. Mas a que custo?
A economia do ciberespaço e das server farms não tem nenhum mecanismo de auto regulação que limite o seu crescimento. As questões-chave para o negócio são como obter energia barata e como manter o tempo de transmissão em milissegundos. As receitas dos serviços como o Facebook e o YouTube não derivam de custos para os utilizadores logo, do ponto de vista de um utilizador inocente, o ciberespaço é infinito, livre e limpo. Enquanto as pessoas não sentirem nenhum custo ao enviar as suas fotos e vídeos, irão fazê-lo e os seus conteúdos irão ficar na nuvem para sempre. O vídeo livre é como a gasolina livre ou o ar condicionado ar livre: quem não pagar a conta de um recurso irá usá-lo sem restrição. E é exactamente isso que está a acontecer no ciberespaço.
Se ninguém vê os seus vídeos no Youtube, ele precisa estar a ocupar espaço físico em vários discos rígidos de propulsão eléctrica espalhados pelo mundo? Num nível mais profundo, o nosso impulso inexorável para criar uma eterna memória abrangente demonstra o medo do esquecimento. Mas será o esquecimento terrível ao ponto de nos levar a conduzir o planeta mais próximo do abismo, a fim de evitar a perda de qualquer migalha de informação, não importa o quão trivial esta possa ser?
Mas eu não estou a sugerir que paremos de utilizar a Internet! Nós inventámos a Internet porque temos que comunicar, partilhar, aprender e trocar ideias. Isso é o que nos torna humanos. Daí o pathos do nosso dilema: o impulso lindo e insaciável que temos de comunicar através de todas as distâncias pode estar a levar-nos mais perto da nossa própria destruição. Se desligarmos o sistema e virarmos as costas ao um sonho da comunicação global poderemos estar simultaneamente a morrer por termos sacrificado o nosso sonho humano comum. Este é o drama mais elevado de existência no século XXI: a grandeza do nosso admirável mundo novo tem um custo.
Que podemos fazer para melhorar o ciberespaço?
Então o que podemos fazer? Podemos reduzir as emissões da Internet, encontrando fontes
alternativas de energia, mas seu crescimento galopante vai rapidamente acabar quaisquer ganhos de eficiência que possamos vir a descobrir. Poderemos fazer evoluir os novos modelos de negócios e de governo com rapidez suficiente para atingir um ponto de inflexão do aquecimento global? Provavelmente não, ainda não o fizemos, apesar de tudo o que já conhecemos.
O ciberespaço é um lugar onde as nossas acções podem fazer uma grande diferença. Aqueles 15 biliões de fotos e vídeos no Facebook e sabe-se lá quantos vídeos no YouTube não foram lá colocados pelas petrolíferas, fomos nós! Nós, os utilizadores temos o poder de retardar o crescimento da Internet que se revela asfixiante para o planeta. Temos que encarar as emissões de CO2 produzidas pelas nossas actividades online, como custos internos para o planeta. Podemos começar por revelar consciencialização sobre o problema restringindo os nossos uploads, e mesmo retirando alguns. E se, em vez de 1.000 fotos emissoras de CO2 no Facebook, apenas mantivermos as melhores 200? Se ninguém vê o seu vídeo de karaoke no YouTube, apague-o. Ou, pelo menos, guarde-o onde não necessite de estar sempre a consumir energia.
E se a consciencialização e a auto disciplina não forem suficientes? Vale a pena considerar a possibilidade de haver um custo para a partilha de grandes volumes de informação pessoal, tipo um imposto de upload. É a única maneira de conseguir que a maioria das pessoas pare de fazer upload de enormes quantidades de informação inútil para o ciberespaço; têm que pagar pela energia real e espaço que estão a utilizar. A informação será sempre de livre acesso mas esta ideia é que a informação não deve ser necessariamente livre para distribuir e ocupar espaço nos servidores da Internet. Se deseja publicar mais do que uma certa quantidade, deve ter que pagar o aluguer do espaço físico que os seus megabytes e gigabytes ocupam. Se os uploaders tiverem que pagar, muitas das fotos e vídeos que ninguém vê seriam retiradas da Internet e as consequentes emissões de CO2 provenientes das server farms começariam a declinar. O dinheiro do aluguer poderá ir para o desenvolvimento de fontes alternativas de energia, por exemplo.
O futuro do ciberespaço tem um preço
Temos que tirar a nossa cabeça da nuvem e voltar à terra firme onde sabemos que alugar espaço custa dinheiro. A proliferação das server farms que alimentam a ilusão do ciberespaço vai engolir mais e mais terras e cuspir mais e mais gases de estufa. Se a experiência de vida que estamos a preservar online nos custar as próprias vidas, então será melhor confiá-la ao efémero e imperfeito espaço de armazenamento conhecido como o cérebro humano e aceitar os riscos dai decorrentes. Se já perdemos a maioria das peças de Ésquilo, Sófocles e Eurípides, acho que também sobreviveremos à perda do vídeo do Zé a esmagar a lata de cerveja na cabeça. A questão é, será que os Zés do mundo podem continuar a colonizar a nossa terra e a usar a nossa energia sem pagar por isso? Ou será que os devemos fazer pagar por esse privilégio?
Talvez devamos abraçar uma solução à moda antiga para o desperdício de espaço cibernético em vários sites, que ainda é utilizada por essa forma arcaica de comunicação, a televisão. Quando um determinado programa de TV tem audiências muito baixas, é retirado do ar. Talvez os administradores do YouTube, e sites afins, devessem fazer o mesmo para os vídeos que ninguém vê.
Mas o que fazemos à liberdade de expressão?
Outros clamam que o consumo energético da Internet é trivial comparado com os benefícios que trouxe nomeadamente em termos de divulgação de mensagens ecológicas e despertar de consciências para o problema do aquecimento global.
O que acham?